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Tartarugas marinhas começam a chegar
ao Extremo Sul da Bahia para a desova

30 out 2003

- Primeiras desovas da temporada já foram registradas no Extremo Sul da Bahia.

-  Cerca de 300 desovas são esperadas até o final da temporada, em março.

- Redes de pesca, fotopoluição, caça e coleta de ovos estão entre as principais ameaças às tartarugas marinhas.

- Conheça mais sobre as cinco espécies que freqüentam o litoral do Extremo Sul da Bahia.

 
Desova de tartaruga-cabeçuda, acompanhada pelo coordenador da ONG Projeto Amiga Tartaruga, Paolo Botticelli. Crédito: Projeto Amiga Tartaruga.

Eunápolis, Bahia - A temporada de desovas de tartarugas marinhas já começou no Extremo Sul da Bahia. Os primeiros doze ninhos foram encontrados desde o final de setembro e muitos outros devem surgir nos próximos meses. Até março, são esperadas cerca de 300 desovas feitas por fêmeas de quatro espécies, que voltarão às praias em que nasceram no Sul da Bahia para construírem ninhos na areia e depositarem seus ovos.  

O pico da temporada começa nas próximas semanas. Vai da segunda quinzena de novembro a meados do mês de dezembro. Ao final, apenas nas desovas que são regularmente acompanhadas, devem nascer na região cerca de 26 mil filhotes. 

Os dados são da organização não governamental Projeto Amiga Tartaruga (PAT), que há 5 anos assina o Protocolo para Proteção das Tartarugas Marinhas com o Projeto Tamar/Ibama para monitorar as desovas em cerca de 200 km de litoral no Sul da Bahia, atuando principalmente no trecho entre as cidades de Prado e Belmonte.  

Segundo o coordenador geral da organização, Paolo Botticelli, das cinco espécies de tartarugas marinhas que desovam no Brasil, quatro procuram regularmente as praias do Extremo Sul da Bahia. "Todas estão na lista internacional de espécies ameaçadas de extinção, sendo que duas delas, a tartaruga gigante e a tartaruga de pente constam como criticamente ameaçadas na lista da  União Internacional pela Conservação da Natureza", relata Paolo. As outras tartarugas que procuram as areias quentes do Sul da Bahia para depositarem seus ovos são as tartarugas cabeçuda e oliva. Indivíduos juvenis de uma quinta espécie de tartaruga, a verde, freqüentam esse trecho do litoral para se alimentar.

Desde o início do mês, a ONG fornece ajuda de custos a três colaboradores remunerados que monitoram diariamente as praias para encontrar e proteger as desovas. O objetivo é registrar a chegada das fêmeas e apagar os rastros deixados na areia para que o ninho não seja encontrado por possíveis pedradores. A equipe de campo do PAT conta ainda com dois  estudantes de biologia que atuam como estagiários, três biólogos voluntários, e cerca de outros 200 colaboradores eventuais. A educação ambiental é uma das ações prioritárias. De janeiro a setembro deste ano, mais de 8.000 pessoas já assistiram a palestras oferecidas pelos voluntários da entidade.

 O Projeto Amiga Tartaruga recebe visitas técnicas periódicas dos técnicos do Projeto Tamar/Ibama, que mantém 20 bases no país e monitora cerca de 1.000 km de litoral. Por ano, o Tamar acompanha o nascimento de cerca de 600 mil filhotes de tartarugas marinhas, número que ultrapassa 10 milhões desde a criação do Centro.

 

Ameaças: pesca acidental, luzes, caça, poluição e atropelamento

 

Tartaruga com as marcas de afogamento no pescoço e com tumores típicos de fibropapilomatose em baixo da nadadeira esquerda. Crédito Paolo Botticelli / Projeto Amiga Tartaruga.

Apesar dos trabalhos de proteção, as tartarugas marinhas continuam ameaçadas na região. E os perigos vêm de todos os lados. O principal problema hoje são as redes de pesca. Muitas vezes as tartarugas são acidentalmente presas nas malhas e, por não poderem vir à superfície para respirar, acabam desmaiando. Caso não recebam o socorro, ou sejam atiradas ao mar ainda desmaiadas, essas tartarugas morrerão afogadas. "Só no ano passado avistamos 274 tartarugas marinhas afogadas ou doentes na área monitorada pelo Projeto Amiga Tartaruga. Quase todas da espécie Chelonia Mydas, ou tartaruga verde", relata Paolo Botticelli.

Outro destino das tartarugas capturadas acidentalmente é muitas vezes o comércio ilegal. Além de infringir a lei, quem compra carne de tartaruga marinha corre o risco de contrair uma série de doenças graves.  "A bibliografia existente indica que as tartarugas podem ser vetores de hepatites, turbeculoses e salmonelas, podendo eventualmente colocar em risco a saúde das pessoas que se alimentam de sua carne", disse Paolo.  As tartarugas também são vítimas de um tipo de doença viral, a fibropapilomatose, cujos efeitos ainda não são conhecidos nas pessoas que se alimentam delas. Cerca de 60% das tartarugas verdes no litoral do Extremo Sul da Bahia apresentam na pele os tumores característicos dessa virose, que pode leva-lás também à morte. (Na foto ao lado, uma tartaruga com as marcas típicas de afogamento no pescoço e com tumores típicos da fibropapilomatose em baixo da nadadeira esquerda.)

A fotopoluição é outra grave ameaça. A presença de luzes fortes próximo aos locais de postura dos ovos afugenta as tartarugas que chegam para a desova e desorienta os filhotes. Atraídas pelas luzes, as tartaruguinhas se afastam do mar e acabam indo parar em estradas, onde correm risco de atropelamento, ou em áreas de restinga, onde podem morrer desidratadas. Entre 1997 e 2001, a ONG Projeto Amiga Tartaruga registrou a morte de mais de 5.500 filhotes por atropelamento na orla norte de Porto Seguro.

Hoje existem uma portaria do Ibama (nº 11 de 30/1/95) e uma Lei Estadual (nº 7034, de 13/12/97) que restringem a iluminação em locais de nidificação de tartarugas marinhas. Nessas áreas devem-se utilizar luminárias especialmente desenhadas para que a luz não incida diretamente sobre a praia. No Extremo Sul da Bahia, a legislação protege especialmente o trecho do litoral que vai de Prado à Ponta do Corumbau. Essa região é hoje legalmente considerada como área zero lux, onde não é permitida nenhuma iluminação na orla. Nas demais praias do Extremo Sul, que registram a presença de ninhos de tartarugas marinhas, a iluminação deve atender a critérios técnicos estabelecidos pelo Ibama.

Em 2001, o Projeto Amiga Tartaruga realizou campanha para alterar a iluminação da Orla Norte de Porto Seguro, com sucesso. Outra vitória foi obtida na cidade de Prado. Em parceria com a ONG Associação Pradense de Proteção Ambiental (APPA), o Projeto Amiga Tartaruga conseguiu sensibilizar  o Conselho Municipal de Meio Ambiente e a Câmara de Vereadores para que fosse interrompido o projeto de iluminação pública ao longo das praias onde ocorrem desovas. "Hoje enfrentamos problemas em Santa Cruz de Cabrália e na área de influência das lâmpadas do Terminal da Veracel, em Belmonte. Nesta última já foram realizadas duas vistorias por equipe formada por técnicos do Tamar, da Coelba e do Projeto Amiga Tartaruga para sugerir soluções que diminuam a fotopoluição na área", informa Paolo Botticelli. 

Outro problema que coloca as tartarugas em risco é a poluição das águas por elementos orgânicos e inorgânicos, como petróleo, lixo, esgoto, que interferem na alimentação, locomoção e prejudicam o ciclo de vida desse animais. A caça de tartarugas no momento da postura e a coleta dos ovos ainda representam uma grave ameaça, apesar da diminuição gradativa nos últimos anos, resultado de campanhas educativas.

O tráfego de pedestres e veículos nas praias durante o período de desova podem aumentar a mortandade dos filhotes, porque tornam a areia compacta e trazem o risco de atropelamento. Além disso, as marcas de pneus na areia dificultam a caminhada dos filhotes em direção ao mar.

Outra ameaça, menos conhecida, são as construções altas e plantações de grande porte no litoral, que podem aumentar significativamente o sombreamento das praias de desova e diminuir a temperatura média da areia, o que irá provocar o aumento no número de filhotes machos, alterando a proporção sexual das populações.

- Dinossauros do mar

As tartarugas marinhas existem há mais de 150 milhões de anos e conseguiram sobreviver a todas as mudanças do planeta. Possuem a visão, o olfato e a audição extremamente evoluídos, além de uma fantástica capacidade de orientação. Na época da reprodução realizam viagens transcontinentais para voltar às praias onde nasceram e desovar. Cada fêmea pode realizar de três a cinco desovas por temporada, com intervalos médios de 10 a 15 dias. Em cada uma depositam em torno de 130 ovos. Pesquisadores do Projeto Tamar já registraram ninhos com apenas 16 e até com 240 ovos. Somente as fêmeas saem à praia. Os machos têm a vida toda na água.

No Brasil, as desovas acontecem entre setembro e março no continente, e entre dezembro e maio nas ilhas oceânicas. Sempre ao anoitecer, já que o calor da areia durante o dia prejudica a postura. Quando a noite vem as tartarugas escolhem um trecho da praia livre da ação das marés e com as nadadeiras anteriores escavam um grande buraco redondo, de mais ou menos dois metros de diâmetro - a cama, onde vão se alojar para iniciar a confecção do ninho.

Depois da postura a tartaruga-mãe volta para o mar e entre 45 e 60 dias após a desova, as tartaruguinhas rasgam o ovo e iniciam a subida dos cerca de 50 centímetros de areia. Uma vai ajudando a outra até alcançarem a superfície da praia e correm para o mar. O nascimento ocorre quase sempre à noite. Para chegarem ao mar elas se orientam pela luminosidade do horizonte. Mas uma chuva forte, provocando o resfriamento da areia, pode levar também ao nascimento de uma ninhada durante o dia.

Os filhotes são pequenos e frágeis, medindo apenas cerca de cinco centímetros. Muitos são devorados por caranguejos, aves marinhas, polvos e principalmente peixes. De cada mil tartarugas nascidas, apenas uma ou duas vão chegar à idade adulta. Nessa fase, poucos animais conseguem ameaça-las - à exceção do homem e do tubarão.  As cinco espécies existentes no Brasil são:

  • Tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta)

Tem a cabeça proporcionalmente maior que a das outras espécies, chegando a medir 25 centímetros. No Brasil, é a que faz maior número de desovas nas praias do continente e é também chamada de tartaruga mestiça. Seu dorso é marrom e o ventre, amarelado. Seu casco mede aproximadamente um metro e pesa cerca de 150 quilos, embora alguns exemplares cheguem a 250 quilos. Come peixes, camarões, caramujos e algas. Suas mandíbulas poderosas lhe permitem triturar as conchas e carapaças de moluscos e crustáceos. É encontrada em praticamente todo o litoral, para desovar procura preferencialmente as praias do norte do Rio de Janeiro, e especialmente as da Bahia, Espírito Santo e Sergipe. É a que ocorre em maior número no Extremo Sul da Bahia, cerca de 85% dos ninhos são feitos por fêmeas dessa espécie.

  • Tartaruga de Pente (Eretmochelys imbricata)

Também chamada de tartaruga verdadeira ou legítima, é considerada a mais bonita das tartarugas marinhas. Tem a carapaça formada por escamas marrons e amarelas, sobrepostas como as telhas de um telhado. A boca lembra o formato de um bico de gavião e o casco pode medir até um metro de comprimento e pesar 150 quilos. Tem este nome porque era caçada para que seu casco fosse usado na fabricação de pentes e armações de óculos. Por isso é uma das mais ameaçadas de extinção. Alimenta-se de peixes, caramujos, esponjas e siris. Na forma juvenil ou semi-adulta é encontrada em todo o litoral do Nordeste, mas o litoral norte da Bahia é o único local onde ainda há um número significativo de desovas remanescentes. No extremo sul, a ONG Projeto Amiga Tartaruga registra entre 25 e 38 desovas anuais.

  • Tartaruga Gigante ou de Couro (Dermochelys coriacea)

É a maior espécie de tartaruga marinha e também a mais forte. É chamada de tartaruga gigante, por medir até dois metros de comprimento de casco e pesar 700 quilos, embora já tenha sido encontrado um exemplar com 900 quilos. De cor preta, com pontos brancos, tem o casco menos rígido que as outras, parecendo quase um couro - por isso ganhou esse nome. Tem grandes nadadeiras frontais, que lhe permitem nadar longas distâncias. Vive sempre em alto-mar, aproximando-se do litoral apenas para desova. Pouquíssimas fêmeas, em torno de sete, desovam principalmente no litoral do Espírito Santo. No Extremo Sul são avistadas cerca de três desovas da espécie por ano.

  • Tartaruga Oliva (Lepidochelys olivacea)

É a menor de todas as tartarugas marinhas, medindo cerca de 60 centímetros e pesando em torno de 65 quilos. Sua carapaça é de cor cinza esverdeada, daí o seu nome. Alimenta-se de peixes, moluscos, crustáceos, principalmente camarões, e plantas aquáticas. No litoral de Sergipe existe hoje a maior concentração de fêmeas dessa espécie desovando no Brasil. No Extremo Sul ocorrem com pouca freqüência, apenas 0,7% das desovas.

  • Tartaruga Verde (Chelonia mydas)

Alimenta-se exclusivamente de algas. Também chamada de aruanã, esta tartaruga tem o casco castanho esverdeado ou acinzentado medindo cerca de 1,20m. Pesa em média 250 quilos, podendo atingir até 350. Sob a forma juvenil pode ser vista, com relativa facilidade, ao longo de todo o litoral brasileiro. Para desovar prefere as ilhas oceânicas, como Fernando de Noronha, em Pernambuco, Atol das Rocas, no Rio Grande do Norte, e Trindade, no Espírito Santo. Curiosamente, a ONG Projeto Amiga Tartaruga registrou uma desova isolada de tartaruga verde no Extremo Sul, o que é extremamente raro.

 

Texto-divulgação do IBAMA/Eunápolis


Última atualização: 30 outubro, 2003 - © EcoAgência de Notícias - NEJ-RS e PANGEA
 
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