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Terça Ecológica

Casa sustentável é pesquisada pela UFRGS

15 out 2003


Sattler fala. O auditório do NORIE foi pequeno e alguns não conseguiram entrar.

Porto Alegre, RS - É possível construir de forma mais saudável e sustentável. Essa foi a lição que o Professor Miguel Sattler deixou na noite desta terça-feira (14/10) aos participantes da Terça Ecológica, evento mensal promovido pelo Núcleo dos Ecojornalistas do RS. Sattler abordou  “As novidades para construir a edificação sustentável”. Cerca de 50 pessoas lotaram o pequeno auditório do NORIE - Núcleo Orientado à Inovação na Edificação, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFRGS.

Há anos pesquisando o assunto, Sattler mostrou diversos exemplos e explicou processos e princípios de construção mais harmônica em relação à natureza e ao convívio humano.

CIDADES - Vivemos em cidades caóticas, onde o próprio conceito de qualidade de vida parece equivocado. Uma pessoa comum acorda todo dia sem saber que a madeira da cama onde dorme foi tratada com  CCA (arseniato de cobre cromatado), processo utilizado para  evitar a invasão de insetos nos móveis que inocula arsênico, substância sabidamente cancerígena. Levanta e abre a janela, recebendo já cedo da manhã o calor poeirento do tráfego intenso da sua rua. Vai ao banheiro e nem se dá conta de que manda água tratada cano abaixo com fezes e urina de volta para o mesmo curso d’água de onde provavelmente a companhia de abastecimento retira o sustento da cidade. Nem é preciso ir adiante para confirmar o descaso com que a maior parte das cidades do mundo é construída.

Preocupados com questões como essas, já nos anos setenta, um casal de arquitetos e urbanistas decidiu repensar a forma de vida urbana, construindo a primeira vila ecológica - Village Homes, na Califórnia. Foram 242 unidades com as seguintes características: máximo aproveitamento da energia solar, sistema viário privilegiando pedestres e ciclistas, casas voltadas para áreas de uso comum, agricultura incorporada à paisagem, drenagem natural, estímulo à vida comum e possibilidade de incorporar moradores de diferentes rendas.

 A partir deste exemplo, muitos outros surgiram nos anos seguintes, e foi assistindo à apresentação de um projeto brasileiro de 1981, que o Engenheiro Agrônomo e Civil Miguel Sattler passou a desenvolver idéias e pesquisas a respeito do tema. Margrit e Declan Kennedy, arquitetos e ambientalistas alemães foram convidados por uma fábrica de São Paulo a projetar uma vila para seus operários. Associados a Bill Mollison – estudioso da permacultura – eles projetaram uma ecovila observando os mesmos princípios da Village Holmes. O projeto não foi implementado, mas serviu de inspiração a muitos.

MUDANÇAS - Sattler defende que precisamos transformar nosso jeito de morar, aproximando as zonas de produção das zonas de consumo, para evitar desperdício de alimentos e combustíveis fósseis, além de utilizarmos processos mais ecológicos e materiais locais, como forma de incentivo à economia local. Ele também afirma que a nossa forma de construir só vai mudar quando as escolas de engenharia e arquitetura estiverem mais preocupadas com a questão. “Parece que só sabemos construir quando está tudo arrasado”, lamenta.

 

Casa Sustentável já foi construída no Campus da UFRGS

 
Sattler historiou o desenvolvimento das casas autônomas

O trabalho do professor Miguel Sattler e seus alunos de pós-graduação no NORIE,, tem se tornado conhecido nos últimos anos. Em 1997, a Prefeitura do município gaúcho de Alvorada convidou o NORIE para projetar seu Horto Municipal. Mais de 30 profissionais entre engenheiros, arquitetos, agrônomos, participaram do projeto, que recebeu verba de uma organização não-governamental canadense. Foi incluído no projeto a construção de uma casa popular sustentável. “Esta é uma universidade pública, nossos olhos devem estar voltados para setores com menos condições econômicas”, justifica.

A casa popular projetada pelo grupo acabou sendo construída no Campus do Vale, da UFRGS, recentemente, com recursos do FINEP e Caixa Econômica Federal. Ela aproveita estudos de orientação solar e dos ventos para planejar o conforto térmico utilizando-se o menos possível de energia elétrica. Todos os materiais utilizados foram pensados de forma que pudessem ser reutilizados, além de serem produzidos o mais próximo possível do local.

A casa é construída em cerâmica, material de baixo impacto e produzido em praticamente todo o Estado. Há coletores de água da chuva para utilização no vaso sanitário, e o projeto inclui sistemas de tratamento de águas negras. O teto foi planejado cuidadosamente, possuindo forro duplo para manter o calor no inverso, com uma saída de ar para auxiliar o resfriamento no verão. “As casas populares normais são incoerentes: elas são um forno no verão e uma geladeira no inverno e isso é desumano”, comenta. Na linha de reaproveitamento de materiais, dentro do forro há uma lâmina refletora, feita com o chapas de fotolito descartadas, que também auxilia no resfriamento.

 Todas as esquadrias são de eucalipto tratado com materiais alternativos, como óleo de linhaça, para reduzir a umidade, evitando o arsênico e a parte externa da casa conta com apoios para a criação de plantas que percam as folhas no inverno, propiciando maior entrada da luz, e floresçam no verão, como a parreira, por exemplo. Cada detalhe foi muito pensado, utilizando-se de conceitos da permacultura. Mas ainda está concluída por falta de verbas, principalmente na sua parte interna. Além dos trabalhadores da construção civil, a  obra contou com a participação dos alunos.. O custo total dos materiais empregados é de R$ 8,650,00.

Com caráter experimental, a casa do Vale tem monitoramento constante de desempenho térmico e iluminação natural. Também tem sido campo de estudos de agronomia, já que o projeto prevê a produção de alimentos para consumo familiar.

Utilizando-se a experiência conseguida com a Casa "Alvorada", implantou-se no Município de Nova Hartz algumas unidades. Também lá o projeto foi abortado por questões administrativas locais. No entanto, as casas estão ocupadas e sofrendo avaliações de pós-ocupações pelos alunos do NORIE.

O NORIE  também foi responsável pelo projeto do Refúgio Biológico Bela Vista, em Foz do Iguaçu, por iniciativa da Itaipu Binacional.  

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Texto: Gisele Neuls - gisele@ecoagencia.com.br - Fotos: Carlos Stein stein@ecoagencia.com.br
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Última atualização: 13 outubro, 2003 - © EcoAgência de Notícias - NEJ-RS e PANGEA
 
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