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Decisão é inédita e ainda cabe recurso no próprio TJ

Philip Morris condenada a indenizar família de fumante falecido

 

29 out 2003

 

Porto Alegre, RS - Três mil e duzentos salários mínimos a título de danos morais, além de danos materiais para cobrir gastos com tratamento de saúde. O valor foi estipulado pela 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, que condenou hoje (29/10) a fabricante de cigarros Philip Morris a indenizar por danos materiais e morais a família de Eduardo Francisco da Silva, fumante por mais de 40 anos e falecido em decorrência de câncer de pulmão. Trata-se da primeira condenação de uma indústria fumageira pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

A decisão, por maioria, decorreu de apelação da esposa,  quatro filhos e dois genros, contra sentença proferida na Comarca de Santa Cruz do Sul, negando a pretensão dos autores. Votaram pela condenação os Desembargadores Adão Sérgio do Nascimento Cassiano e Luís Augusto Coelho Braga, sendo vencida a relatora, Juíza-Convocada Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira.

O julgamento teve início em 30/4/2003, com o voto da relatora, que mantinha a sentença. Ela considerou ser lícita a atividade da ré, protegida pelo art. 170, parágrafo único, da Constituição Federal, e que a publicidade em torno do consumo e aquisição de cigarros jamais poderá ser taxada de enganosa ou abusiva. “Não há qualquer prova de que o falecido iniciou o consumo de cigarros porque sucumbiu à maciça propaganda deste”, analisou. Invocando o livre arbítrio, julgou evidente haver culpa do consumidor, que assumiu voluntariamente o risco de desenvolver doenças pulmonares e outras moléstias a partir do hábito de fumar. “Foram 40 anos de tabagismo escancarado”.

Referiu a magistrada que o dano não seria derivado diretamente do produto, “senão do vício incontrolável do de cujus,  que preferiu o prazer a contê-lo e, quiçá, desenvolver hábitos mais saudáveis, os quais poderiam obstaculizar ou estancar o desenvolvimento de doenças”.

Após o voto da relatora, pediu vista do processo o Desembargador Adão Cassiano. O julgamento teve continuidade na sessão da Câmara realizada hoje, na qual o magistrado proferiu extenso e fundamentado voto, cuja leitura durou mais de duas horas. Ele asseverou ser inegável que o fabricante ocultou, pelo menos desde a década de 50, os malefícios decorrentes do hábito de fumar, como dependência química e psíquica, enfisema pulmonar e câncer de pulmão.

Omissão e negligência

A culpa da fabricante, conforme o magistrado, decorre de omissão e negligência. O Código Civil de 1916, em seu artigo 159, previa ressarcimento de prejuízos a terceiros, decorrentes de omissão. O criador do risco, assinalou, tem o dever de evitar o resultado. “Tendo a indústria pleno conhecimento dos malefícios à saúde de fumantes e não-fumantes, criado conscientemente o risco, e nada fazendo para evitá-lo, caracterizada a culpa por omissão”. Reconheceu ser lícita a atividade da indústria fumageira, mas ressaltou que esta, altamente lucrativa, desde o princípio teve consciência de que o cigarro vicia e causa câncer, beirando as fronteiras do dolo.

A ocultação dos fatos, de acordo com o Desembargador, foi mascarada por publicidade enganosa, massificante e aliciante. “Foi necessário um verdadeiro clamor público mundial para frear a ganância, e adotadas medidas de prevenção a partir de determinação dos órgãos governamentais”.  Afirmou que ao indivíduo não se faculta a livre opção, pois sempre houve publicidade apelativa, sobretudo em relação aos jovens.

“Desimporta a licitude da atividade. Ante as conseqüências desastrosas de tal produto, que levam, mais tragicamente, à morte, não pode o fabricante esquivar-se de arcar com as indenizações correspondentes”. Fez ainda alusão ao Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que o produto não deve causar danos a quem o adquire.

Reiterando as ponderações, o Desembargador Luís Augusto Coelho Braga acrescentou que há falha na segurança do produto, pois no momento em que o indivíduo compra um cigarro, pagando seu preço, está estabelecido um contrato com o produtor. “Contrato injusto, pois a vontade fica viciada, tornando o consumidor vítima do fumo”.

Condenação

A indenização por danos materiais deverá ressarcir a venda de um imóvel e de 15 bovinos; despesas médicas e hospitalares comprovadas, hospedagem de acompanhantes durante a internação em Porto Alegre e gastos com o funeral; e fechamento do minimercado, desde a época da constatação da doença até a data em que a vítima completaria 70 anos, de acordo com a média de lucro dos últimos 12 meses de funcionamento.

A título de danos morais foi fixada a quantia de 600 salários mínimos nacionais para a esposa, de 500 para cada um dos quatro filhos e de 300 para cada um dos dois genros.

 

Texto da Assessoria de Imprensa do TJ RS - Proc. 70000144626 (Jornalista Adriana Arend)


Última atualização: 21 outubro, 2003 - © EcoAgência de Notícias - NEJ-RS e PANGEA
 
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