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ONGs articulam aprovação do PL da Mata Atlântica, que
tramita há 11 anos na Câmara dos Deputados

EcoAgência de Notícias
07-mai-03

Brasília, 07/05/03 - A Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) inicia amanhã (08 de maio), em Brasília, uma série de reuniões com lideranças partidárias visando aprovar no plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei que define regras para a utilização e a proteção dos ecossistemas que integram a Mata Atlântica, hoje o bioma mais ameaçado do Brasil, com apenas 7% de sua área original. As reuniões fazem parte das atividades do 8º Encontro Nacional da Rede Mata Atlântica, que acontece até o próximo dia 9.

O Projeto de Lei da Mata Atlântica – originalmente PL nº 3.285/92, e atualmente PL nº 285/99 - está tramitando há 11 anos na Câmara Federal e tem sofrido forte oposição da bancada ruralista (veja cronologia abaixo).

Apresentado pela primeira vez em outubro de 1992, o PL da Mata Atlântica regulamenta o parágrafo 4º do Artigo 225 da Constituição Federal, que define a Mata Atlântica como “patrimônio nacional” e determina que sua utilização se fará “na forma da lei”. O texto - que já esteve três vezes para ser votado no plenário da Câmara, mas foi retirado na última hora - define os limites geográficos do domínio da Mata Atlântica, cria regras para a exploração econômica e para a supressão de seus remanescentes, proíbe o desmatamento onde houver espécies ameaçadas de extinção e incentiva a recuperação, o uso sustentável e a pesquisa científica destinada à conservação de sua biodiversidade.

“Decidimos pela primeira vez fazer um encontro nacional em Brasília, fora dos domínios da Mata Atlântica, para sinalizar nossa prioridade à aprovação do Projeto de Lei”, afirma Renato Cunha, coordenador-geral da RMA. Além da visita aos líderes dos partidos, representantes das 224 entidades que integram a Rede farão um corpo-a-corpo junto aos deputados de seus estados, visando convencê-los da necessidade de aprovação do Projeto de Lei da Mata Atlântica ainda neste semestre.

Uma “agenda positiva” para a Mata Atlântica

Além de reivindicar a aprovação do Projeto de Lei da Mata Atlântica, a RMA vai cobrar do governo federal a implantação de uma política nacional para o bioma. Por isso, no dia 9 os representantes das ONGs terão reuniões com representantes do Ministério do Meio Ambiente, do Ibama e do Banco Mundial, quando será discutida a adoção de uma “agenda positiva” para a Mata Atlântica, que tenha como referência diretrizes aprovadas em dezembro de 1998 pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

“A aprovação da lei é fundamental, mas não basta para retirar a Mata Atlântica da dramática situação em que está. Precisamos de uma agenda positiva que viabilize o uso sustentável dos recursos naturais e a recuperação do bioma”, esclarece Renato Cunha. Os representantes da RMA pretendem que esta agenda seja convertida em programas governamentais incluídos no Plano Plurianual 2004-2207, cuja discussão já está em curso dentro do governo federal.

A situação da Mata Atlântica hoje

A Mata Atlântica é formada por um conjunto de formações florestais - Floresta Ombrófila Densa, Floresta Ombrófila Mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Estacional Decidual e encraves florestais do Nordeste -, além de outros tipos de vegetação, como manguezais, restingas e campos de altitude associados e brejos interioranos, localizados ao longo da costa brasileira, do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, que interiorizam-se cerca de 100 km na costa norte e mais de 500 km no sul, alcançando a Argentina e Paraguai. A Mata Atlântica é o segundo ecossistema mais ameaçado do mundo, perdendo apenas para as quase extintas florestas da ilha de Madagascar, na África.

MATA ATLÂNTICA ÁREA ORIGINAL: 1.290.692 km2 (100%)

ÁREA REMANESCENTE (1995): 95.641 km2 (7%)

ABRANGÊNCIA DO BIOMA: 17 dos atuais estados brasileiros

Nesses 500 anos de constituição do país, a Mata Atlântica passou por uma série de ciclos de conversão de seus ecossistemas em outros usos, o que resultou em paisagens altamente fragmentadas. A região abriga hoje os maiores pólos industriais e as mais densamente povoadas concentrações urbanas do Brasil. O último levantamento sobre a situação do bioma, realizado entre 1995 e 2000, indica restar o equivalente a 7% de sua área original – cerca de 95.641 km². As diferentes formações vegetais que constituem esses remanescentes continuam sob ameaça, estando mal conservadas, explorados ilegalmente, com espécies quase extintas, ou ainda sub-representadas nas unidades de conservação existentes.

Mesmo nessas condições, a Mata Atlântica abriga uma parcela significativa da diversidade biológica do Brasil, com altíssimos níveis de endemismo. A riqueza se sua biodiversidade é tão significativa que os dois maiores recordes mundiais de diversidade botânica para plantas lenhosas foram registrados nessa região: 454 espécies em um único hectare, no sul da Bahia, e 476 espécies em uma amostra de mesmo tamanho, no norte do Espírito Santo.

A Mata Atlântica acolhe algumas das mais altas taxas de diversidade de espécies do mundo: a variedade de sua flora está estimada em 20 mil espécies, seis mil das quais endêmicas. Para se ter uma idéia de sua riqueza biológica, enquanto em um hectare de floresta na América do Norte são encontradas entre quatro e 25 espécies diferentes, na Mata Atlântica podem ser encontradas 400 espécies em área equivalente. Mesmo severamente reduzidos, seus remanescentes asseguram serviços importantes para cerca de 120 milhões de pessoas que habitam seus domínios, como o abastecimento de água, a estabilidade do solo, o equilíbrio do microclima, o controle de pragas e o uso de manejo múltiplo.

Cronologia da Tramitação do PL da Mata Atlântica

Agosto de 1992: o deputado Renato Vianna (SC) apresenta o PL nº 3.144/92, que trata da utilização e da proteção da Mata Atlântica.

. Outubro de 1992: o deputado federal Fabio Feldmann (SP) apresenta à Câmara dos Deputados o PL nº 3.285, que trata da utilização e da proteção da Mata Atlântica, com apenas 12 artigos. Sua formulação teve como base uma proposta de regulamentação aprovada no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e que foi convertida no Decreto nº 750/93.

. Janeiro de 1993: por tratar do mesmo tema e por ter sido apresentado posteriormente, o PL nº 3.285/92 é anexado ao PL nº 3.144/92, considerado como texto principal no âmbito do Legislativo.

. Fevereiro de 1993: os dois textos são encaminhados à Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias (CDCMAM), única comissão de mérito indicada para se pronunciar sobre o assunto. A deputado Rita Camata (ES) indicada relatora da Comissão. Porém, a matéria fica sem ser apreciada até o fim da legislatura 1991-1994, quando é arquivada.

. Fevereiro de 1995: reeleito deputado por São Paulo, Fabio Feldmann solicita o desarquivamento do PL nº 3.285/92, que passa a ser o texto principal sobre o tema no âmbito da Câmara dos Deputados.

. Fevereiro de 1995: a fim de restringir o alcance do Decreto nº 750/93 – então o mais eficaz instrumento legal de proteção à Mata Atlântica -, o deputado Hugo Biehl (SC) apresenta o PL nº 69/95, por meio do qual limita a abrangência da Mata Atlântica ao domínio da floresta ombrófila densa e às formações pioneiras com influência marinha (restingas) e com influência fluviomarinha. O PL nº 69/95 é anexado ao PL nº 3.285/92.

. Março de 1995: o texto é encaminhado à Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias (CDCMAM) e tem como relator o deputado Wilson Branco.

. Junho de 1995: apresentado o PL nº 635/95, de autoria do deputado Rivaldo Macari (SC), que exclui dos limites da Mata Atlântica as florestas ombrófilas mistas, ou florestas de araucária, uma das mais ameaçadas no país. É também anexado ao PL nº 3.285/92.

. Agosto de 1995: a CDCMAM aprova a proposta de seu relator, deputado Wilson Branco, com o acréscimo de nove emendas ao PL original. São rejeitadas integralmente as teses contidas nos PLs nº 69/95 e nº 635/95, dos deputados Hugo Biehl e Rivaldo Macari. Coordenada pelos deputados Fabio Feldmann e Sarney Filho (MA), presidente da comissão, a aprovação suscita reação furiosa de madeireiros e ruralistas.

. Setembro de 1995: inconformado com a aprovação do PL na CDCMAM, os deputados Paulo Bornhausen (SC) e José Carlos Aleluia conseguem que o PL seja enviado à Comissão de Minas e Energia (CME), impedindo que a matéria seguisse para a Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR). Em sua justificativa, Bornhausen, que assume a relatoria do PL na CME, afirma que o texto aprovado na CDCMAM afeta a geração e o consumo de energia, uma vez que restringe a produção de lenha.

. Outubro de 1997: no dia 22, a CME aprova o substitutivo ao PL nº 3.285/92, de autoria do deputado Paulo Bornhausen. Os deputados Luciano Zica (SP) e Octávio Elísio (MG) apresentam voto em separado, alegando que o substitutivo “subverte os propósitos do PL 3285/92, vale dizer, ao invés de proteger a Mata Atlântica, vai permitir a destruição dos exíguos remanescentes dessa floresta”. No mesmo dia, o deputado Luciano Zica apresenta recurso à presidência da Câmara dos Deputados, solicitando a rejeição do substitutivo, sob a justificativa de ter havido desrespeito ao Regimento Interno da casa, já que a Comissão abordou questões que não eram de sua competência. A armação é denunciada também em plenário pelos deputados Zica e Octávio Elísio. Na mesma sessão, o relator do substitutivo, Paulo Bornhausen, reconhece o equívoco do procedimento por ele conduzido na Comissão.

. Novembro de 1997: o presidente da Câmara, Michel Temer decide em favor do recurso apresentando pelo deputado Luciano Zica, sob o argumento de que a Comissão de Minas e Energia “extrapolou os limites regimentais de sua competência” ao aprovar o substitutivo do deputado Paulo Bornhausen. A matéria é devolvida à CME, com a orientação de que seu parecer seja reformulado.

. Dezembro de 1997: um acordo entre líderes partidários resulta em uma proposta que é enviada para votação no plenário da Câmara dos Deputados em regime de urgência. Porém, diante do temor de ambientalistas quanto aos possíveis efeitos de algumas das mudanças promovidas no âmbito dessa negociação, a proposta é retirada da pauta.

. Junho de 1998: o deputado Odelmo Leão, da bancada ruralista, solicita a inclusão da Comissão de Agricultura e Política Rural entre as comissões habilitadas a apreciar a matéria; seu pedido é negado.

. Fevereiro de 1999: com o fim da legislatura 1995-98, o PL nº 3.285/92 é arquivado. Fabio Feldmann não se reelege e o deputado Jaques Wagner (BA) apresenta um novo texto sobre o tema, tomando como base a proposta negociada no final de 1997, que recebe o nº 285/99. No mesmo mês, porém, uma nova interpretação do Regimento Interno da Casa permite o desarquivamento do PL nº 3.285/92, a fim de restabelecer a tramitação de um dos projetos a ele anexados.

. Junho de 1999: os ruralistas solicitam, pela segunda vez, a inclusão da Comissão de Agricultura e Política Rural entre aquelas habilitadas a emitir parecer sobre o PL nº 285/99. A solicitação, que tinha como objetivo alterar pontos que contrariavam os interesses do setor rural, especialmente os limites do domínio da Mata Atlântica, é negada mais uma vez.

. Agosto de 1999: a Comissão de Minas e Energia (CME) decide pela “incompetência para se pronunciar sobre o PL nº 3.285/92”.

. Dezembro de 1999: após meses de debate e de pressão da sociedade civil, a Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias aprova o substitutivo do deputado paranaense Luciano Pizzatto ao PL nº 285/99, do deputado Jaques Wagner. O texto aprovado, com 66 artigos, tenta superar o conflito em torno da configuração geográfica da Mata Atlântica adotando o conceito de “Ecossistemas Atlânticos”, sob o qual mantém a descrição contida no texto original. O substitutivo aparece dividido em seis títulos, um dos quais (Título IV) defende que o Poder Público “estimulará, com incentivos econômicos, a proteção e o uso sustentável dos Ecossistemas Atlânticos”, o que suscitará um novo front de oposição ao projeto.

. Abril de 2000: o substitutivo ao PL nº 285/99 é anexado ao PL nº 3.285/92, que reassume seu estatuto de texto principal. Com isso, a proposta do então deputado Fabio Feldmann passa a ter três PLs anexados – além do substitutivo, os PLs nº 69 e nº 635.

. Maio de 2001: o relator da matéria na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ), Fernando Coruja (SC), assina parecer no qual considera o PL nº 3.285/92 “inconstitucional” por “invadir a seara normativa do Presidente da República ao atribuir uma série de competências a órgãos e entidades integrantes da estrutura do Poder Executivo”. Porém, decide pela “constitucionalidade, juridicidade e boa técnica” do substitutivo ao PL nº 285/99, ao qual propõe modificações por meio de subemenda substitutiva, e dos PLs nº 69 e nº 635. Curiosamente, as mudanças do relator ao PL nº 285 apresentam problemas de redação, que interferem no mérito da proposta.

. Maio de 2002: A CCJ aprova proposta do deputado Inaldo Leitão que dá nova redação ao parecer pelo deputado Fernando Coruja, corrigindo os problemas anteriormente identificados.

. Junho de 2002: um novo acordo de lideranças permite levar os PLs à votação no plenário da Câmara. Porém, um requerimento da bancada ruralista acaba por retirá-lo da pauta. Na ocasião, circulam informações de que a área econômica do governo também tinha restrições ao capítulo que trata dos incentivos econômicos para a proteção da Mata Atlântica, que desrespeitaria a Lei de Responsabilidade Fiscal.

. Fevereiro de 2003: o PL nº 285/99 é, mais uma vez, incluído na pauta de votação do plenário da Câmara dos Deputados. Porém, resulta em nova retirada do texto da pauta, já que o governo recém-empossado ainda não havia apreciado a matéria.

. Março 2003: um acordo entre a liderança do PT na Câmara, o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério da Fazenda resulta em parecer favorável, por parte do governo federal, à aprovação do PL da Mata Atlântica. O texto aguarda nova oportunidade para ser incluído na pauta de votação da Casa.

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A Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) foi criada em 1992 como um fórum de debate e instrumento de representação política da sociedade civil, visando promover a conservação e a recuperação dos ecossistemas que integram o domínio da Mata Atlântica. Atualmente, a RMA reúne 224 organizações não-governamentais sediadas nos 17 estados que abrangem o bioma.

(Assessoria de Imprensa do Encontro Nacional da Mata Atlântica)


Última atualização: 06 setembro, 2011 - © EcoAgência de Notícias - NEJ-RS e PANGEA
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