Em Brasília, moradores prejudicados pela criação do parque solicitam apoio de autoridades e parlamentares federais
EXCLUSIVO - EcoAgência de Notícias
12-abr-03
Brasília, 12/04/03 - A conservação de um dos mais recentes paraísos ecológicos do país está trazendo transtornos para 22 comunidades de pequenos produtores e de extrativistas que vivem na área rural do município de Mateiros, no Estado de Tocantins (TO). Um ofício enviado pela Associação de Artesões e Extrativistas do Povoado da Mumbuca, essa semana, para autoridades federais e parlamentares da bancada amazônica, denuncia vícios na criação do Parque Estadual do Jalapão, de 1.588,85 km².
A definição dos limites do Parque, pelos técnicos da Secretaria de Planejamento (Seplan) do Governo do Estado do Tocantins, ignorou a presença das 22 comunidades rurais, que acabaram ficando dentro da unidade de conservação. Com a aprovação da proposta de limites pela Assembléia Legislativa do estado, em janeiro de 2001, subitamente, e sem aviso prévio, 543 pessoas passaram a estar ameaçadas de despejo. Segundo o documento que circulou por gabinetes de Brasília, grande parte das famílias atingidas pela medida está na área desde os primórdios de sua ocupação, por volta de 1930.
A categoria “parque estadual”, de acordo com a Lei nº 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, é uma unidade de conservação de proteção integral e, portanto, não admite pessoas residindo em seu interior. Porém, segundo o documento dos moradores do Povoado da Mumbuca – uma das comunidades prejudicadas pela Seplan -, essa mesma lei foi desrespeitada, já que a delimitação do parque deveria ter sido precedida de consulta pública aos interesses afetados, conforme disposto no parágrafo 2º do artigo 22.
A geógrafa e especialistas em conservação Heloísa Orlando, que assessora a associação dos produtores da Mumbuca, informou à EcoAgência que os órgãos estaduais responsáveis pelo Parque Estadual do Jalapão só organizaram uma audiência pública três meses depois de sua criação, já com o objetivo de informar os moradores de que teriam que deixar suas terras. “Os técnicos foram surpreendidos pela reação das comunidades, que estavam informadas sobre o fato e protestaram contra a decisão, pedindo a correção dos limites”, afirma Heloísa Orlando.
Praticamente desconhecido até seis anos atrás, o Jalapão está localizado no leste do Tocantins, em uma região de transição entre os biomas Cerrado e Caatinga, e se caracteriza por uma grande diversidade de paisagens. O súbito aumento do fluxo de turistas para a região – de ecoturistas a aventureiros mais predatórios, adeptos de esportes motorizados off road – ensejou a necessidade de dar proteção especial à região. Entre 2000 e 2002, os governos estadual e federal envolveram a região em um mosaico de unidades de conservação de diferentes categorias.
Uma delas, a Área de Proteção Ambiental Estadual do Jalapão, criada em setembro de 2000, estendeu-se sobre a área ocupada pelas comunidades. Para estas, a criação da APA não trouxe transtornos, já que suas finalidades de conservação se conciliam com as necessidades de proteção pretendidas pelos moradores – que produzem um original artesanato feito com fibras de buriti e uma sempre-viva conhecida como capim dourado. De repente, a Seplan decidiu criar o parque estadual sobre a APA criada quatro meses antes, demonstrando confusão técnica na definição da categoria de manejo.
“Tecnicamente, a delimitação do parque poderia ter sido definida sem criar problemas e impacto social, porque essas 22 comunidades já viviam dentro de uma unidade de conservação de uso sustentável. Em termos de estratégia de conservação e de desenvolvimento social, essas áreas de povoamento poderiam ter ficado fora dos limites do parque e permanecido nos limites da APA”, postula o documento dos moradores do Povoado da Mumbuca.
Além da ameaça de serem retirados de suas terras, a criação do parque interrompeu estudos que vinham sendo feitos no âmbito do Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (Probio) - projeto coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente em parceria com o CNPq e financiado pelo Global Environmental Facility (GEF), do Banco Mundial-, visando a definir um plano de desenvolvimento sustentável para a área. Isso porque, com a criação do parque, os beneficiários dos estudos passaram a estar em situação de ilegalidade.
“O que aconteceu é que, se antes eles tinham uma visão positiva da conservação, de que lhes traria benefícios, passaram a duvidar disso por conta dos problemas trazidos pelo parque”, afirma Heloísa Orlando. Para estancar os prejuízos e recuperar o apoio do Probio, as comunidades reivindicam a intervenção de ministros federais, da Procuradoria da República e de parlamentares amazônicos, a fim de convencer o governo estadual a enviar um novo projeto de lei à Assembléia Legislativa do estado, corrigindo os equívocos que estão na origem do Parque Estadual do Jalapão.
Marco Antonio Gonçalves - marcoantonio@ecoagencia.com.br para a EcoAgência de Notícias