UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
Audiência no MP sobre o
Delta do Jacuí polariza ecologistas e moradores das Ilhas
O Decreto fere a Constituição, diz Procuradora de Justiça
25 outubro 2004 - Especial para a EcoAgência de
Notícias

Porto Alegre, RS - A Procuradoria Geral de Justiça está permitindo que a legislação seja descumprida e incentivando polarização entre ambientalistas e moradores das ilhas do Complexo do Delta do Jacuí ao deixar de tomar as atitudes cabíveis em relação ao Decreto n° 43.367/2004, de 28 de setembro, que extinguiu o Parque Estadual do Delta do Jacuí, transformando-o em Área de Proteção Ambiental (APA). Esta é a avaliação dos representantes das ONGs
Núcleo Amigos da Terra (NAT) e Curicaca, após a audiência realizada pelo Ministério Público do RS na segunda, dia 25, em Porto Alegre.
Para Kátia Vasconcellos, que representa o NAT na Câmara Técnica de Biodiversidade do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), a audiência representa uma mudança no foco principal do problema.
– A questão central não é a desafetação das áreas habitadas, que estava contemplada no projeto discutido da Câmara técnica, mas a ilegalidade do decreto que extinguiu o parque
– afirma Kátia.

O tom geral do debate foi de um lado os moradores exigindo uma solução para o problema da falta de saneamento que se arrasta há 30 anos, e os ecologistas e técnicos de instituições de proteção ambiental alertando para inconstitucionalidade do decreto e os riscos que a medida do governo representam para a preservação desse ecossistema – fundamental para a preservação da mata atlântica e da fauna e para o controle de enchentes, já que o complexo das ilhas funciona como filtro e esponja regulando a vazão dos rios em épocas de cheias.
Na terça-feira passada, 19/10, o NAT e a Rede de ONGs da Mata Atlântica
procolaram no Tribunal de Justiça a Ação Direta de Inconstitucionalidade -
ADIn - contra o Decreto. A expectativa é de que o Tribunal de Justiça
conceda a liminar suspendendo seus efeitos nos próximos dias. A própria Procuradora
de Justiça Sílvia Capelli, coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente reconhece a
sua inconstitucionalidade. No encerramento da audiência, Capelli clamou por um ponto de equilíbrio na discussão.
– O decreto fere a Constituição Federal, mas isso não significa a retirada das pessoas que moram na região
– concluiu a Procuradora.
Falta informação e esclarecimento aos moradores
Os moradores se dizem inseguros quanto à permanência em suas casas e, em várias de suas falas, demonstravam acreditar que a anulação do Decreto n° 43.367/2004 e o conseqüente retorno da categoria da unidade de conservação a Parque Estadual pode significar a retirada de todas as famílias residentes das ilhas e
o reassentamento em outra zona da cidade. Eles também reclamam, com razão, da morosidade dos governos em resolver o problema de redefinição dos limites do parque.
– Governo após governo ninguém decide nada. Parece que as pessoas gostaram de brincar com as nossas vidas. Nós exigimos respeito e agilidade
– desabafou Beatriz Gonçalves Pereira, presidente da Associação São Francisco de Assis, da Ilha da Pintada.
Todas as associações de moradores presentes na audiência defendem o decreto do governo, apostando que esta pode ser uma saída definitiva para agilizar a concessão da propriedade das casas, além de realização de benfeitorias como a instalação de redes de água e esgoto.
Alexandre Krob, da organização Curicaca, no entanto, alerta que mesmo que se aceitasse a criação da APA tal como foi feita, isso não significaria a solução imediata dos problemas. A APA também é uma unidade de conservação, classificada pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc) como Unidade de Uso Sustentável, que mesmo permitindo a existência de áreas privadas dentro de seus limites, exige licenciamento ambiental para as mesmas, além de um plano de manejo que regule as atividades dentro da área.

Além disso, por se tratar de uma região de banhados, as margens de todas as ilhas e porções continentais abrangidas pelo Delta são Áreas de Preservação Permanente, definidas pelo Código Florestal, de 1965. Isso significa que, independentemente da categoria da unidade de conservação, muitas das residências das ilhas estão em situação irregular e deveriam ser removidas, no mínimo, para a faixa permitida, que pode ficar a uma distância mínima de 30 a 100 metros das margens.
Krob também denunciou total desconhecimento da Câmara Técnica acerca das propostas dos moradores para as áreas que devem ser desafetadas. Amilton Antônio da Silva, da Ilha Grande dos Marinheiros garante que a proposta foi entregue ao Consema, e o próprio representante do governo, Eduardo Krause, disse que o documento foi recebido pelo gabinete do vice-governador, Antônio Hohlfeldt. Entretanto, tanto Krob quanto Káthia dizem que, se o documento chegou ao Consema, não foi anexado ao processo do Delta do Jacuí.
Problema da especulação imobiliária não foi abordado
Com todos esses desacertos e nítida falta de esclarecimento, os interesses econômicos que podem acabar todas as ações de preservação de um dos mais importantes ecossistemas da Região Metropolitana mal foram citados e sequer estavam representados na audiência. As entidades que atum na proteção da Mata Atlântica alertam para a latente especulação imobiliária, já que a região é de grande beleza cênica.
Com a criação da APA, diversos proprietários de sítios e mansões que se estendem ao longo das margens do Delta teriam resolvidos os processos judiciais que se arrastam há anos e poderiam vender as propriedades. Mesmo criação de novos lotes para a construção de condomínios de luxo e iate-clubes não está descartada. Os mineradores que atuam na extração de areia os orizicultores também representam dois outros importantes atores que poderiam ser beneficiados com limites mais flexíveis de exploração não estavam presentes na reunião e foram lembrados apenas nas intervenções das entidades do movimento ecológico gaúcho. Nenhuma das instituições governamentais presentes comentou o assunto.
Nova Audiência
Nesta terça-feira, 26/10, s 14h30min, por pedido da AGAPAN - Associação
Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, o "rezoneamento" do Parque Estadual
Delta do Jacuí, ou do que sobrou dele, estará na pauta de uma reunião
conjunta entre as Comissões de Saúde e Meio Ambiente (COSMAM) e Urbanização,
Transporte e Habitação (CUTHAB da Câmara de Vereadores de Porto Alegre.
Texto da Redação da EcoAgência de Notícias -
redacao@ecoagencia.com.br Fotos
exclusivas de Carlos Stein para a EcoAgência de Notícias.
Última atualização:
06 setembro, 2011 - ©
EcoAgência de Notícias
- NEJ-RS e PANGEA
O texto divulgado pela EcoAgência
de forma EXCLUSIVA poderá ser aproveitado livremente em outros saites e veículos
informativos, condicionada esta divulgação à inclusão da seguinte informação
no corpo do material: Nome do Jornalista - e-mail © EcoAgência de Notícias
- www.ecoagencia.com.br.
As fotografias
deverão ser negociadas com seus autores.
|