AgirAzul Revista 1992-1998

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AgirAzul 7

Lutzenberger testemunha indianos contra a biogética

Protesto de 500 mil por uma agricultura ecológica

Viena - "Vinte por cento da superfície da Holanda está tapada por cimento, asfalto e edifícios, pelo que qualquer ser inteligente deveria reconhecer que assim não se pode seguir", segundo o ecologista e ex-secretário nacional do meio ambiente do Brasil, José Lutzenberger..

Já não existem dúvidas de que a humanidade tem que trocar de ética para poder sobreviver, asseverou em entrevista exclusiva ao IPS em Viena.

"Digo ética, porque com racionalidade nada tem que ver oque estamos fazendo com nós mesmos e a Terra", disse ao explicar sua recente experiência em uma visita à Índia, por convite do líder religioso budista tibetano Dalai Lama. Nenhum capitalista compraria uma custosa máquina sabendo que vai estar 16 horas por dia parada ou estorvando a todo o mundo na fábrica, disse, sublinhando "a atitude totalmente pervertida" de um consumidor ocidental frente ao automóvel.

"Mas o que custa um automóvel cada um poderia comodamente tomar táxi para o resto da vida, e isso sim tem que reinventar nada novo no mundo" disse.

Por isso, se mostra convencido de que"o que estamos fazendo não éem nosso interesse, não é tampouco em interesse de uma economia nacional, é somente de interesse para certos industriais"

Todavia, sob a impressão de sua recente viagem à Índia, Lutzenberger pôs ênfase, na série de discursos e seminários que realizou em Viena, a necessidade de uma nova ética.

Como exemplo que poderia ter transcendência, segundo oecologista, citou o budismo, sem pretender a conversão da humanidade a uma religião em particular. "O budismo, ao contrário da tradição judaico-cristãdo Ocidente, nunca distinguiu entre criação e criador"' e portanto mantém uma ética holística, com uma percepção global e integral da natureza e do homem", explicou.

O homem tem que chegar a uma concepção ecológica da Terra —Gaia, uma unidade viva da qual faz parte a humanidade, asseverou.

Durante sua estadia no sul da India, coube-lhe participar de uma manifestação em Bangalore a qual concorreram 500 mil agricultores para protestar contra a biogenética como instrumento para adquirir propriedade industrial sobre anatureza, e contra o GATT (Acordo Geral de Tarifas de Comércio) como um convênio para globalizar a loucura industrial".

Observou que na Ásia, aparentemente, a conscientização está mais adiantada que no Ocidente, com sua suposta "legendária racionalidade"

Opinou que não se teria que olhar na direção da Ásia ou outras religiões para compreender que a via de desenvolvimento atual resulta "ingovernável" e que as catástrofes globais são previsíveis.

O ecologista gaúcho mencionou como um dos principais caminhos para a humanidade a crise energética, donde a irresponsabilidade dos produtores atuam em uma contínua sobreoferta de matéria prima de reservas limitadas, reduzindo assim os preços em vez de aumentá-los.

(Com Federico Nier-Fischer - publicação autorizada pelo IPS)